A Verdadeira Dimensão do Divórcio
O divórcio é um problema crescente. Só nos países em que é restringido legalmente é que está sob controlo. Mas, porque é que as pessoas se divorciam? As explicações que os divorciados dão a advogados e juízes podem bem ser estereotipadas ou de conveniência para evitar o prolongamento desnecessário do processo. As verdadeiras causas talvez se mantenham ocultas ou só se confiem a pessoas muito chegadas. Uma das fontes mais fidedignas são os psicoterapeutas que ajudam, a um ou a outro membro do casal, a superar a crise.
Causas do divórcio
Os dados recolhidos pelos psicoterapeutas matrimoniais M. A. Whisman, A. E. Dixon, e B. Johnson mostram as seguintes causas de divórcio nos seus pacientes, em ordem de maior ou menor frequência:
1. Problemas de comunicação («Não nos entendemos»).
2. Problemas de autoridade («Não nos pomos de acordo, queremos mandar os dois»).
3. Expectativas não realistas («O casamento deveria ser algo fantástico»).
4. Sexualidade («Não estou satisfeito/a com a nossa vida sexual»).
Outros motivos apresentados são: ausência de sentimentos amorosos, conflitos de valores, problemas de personalidade, infidelidade conjugal, falta de demonstrações de afecto, e questões de dinheiro. Ainda há outras razões menos frequentes (ao compará-las com a totalidade de divórcios), mas de grande relevância: abuso do cônjuge, abuso dos filhos, homossexualidade, álcool e outras drogas.
Razões do tipo sociológico
Também existem razões do tipo sociológico que explicam o divórcio e as suas variantes em diferentes lugares e épocas.
1. O contexto legal. Os países com leis que facilitam o divórcio têm um índice mais elevado do que as nações que põem muitas restrições legais a quem se quer divorciar.
2. O movimento feminista. A mulher tem vindo a compreender que ser esposa não é sinónimo de escravidão, o que está completamente certo. Como consequência, muitas mulheres com um casamento irregular têm dado os passos até conseguirem um divórcio.
3. A melhoria económica. As regiões do mundo mais abastadas têm os índices mais elevados de divórcios. Este requer meios económicos ou possibilidades para sobreviver após a rotura, especialmente no caso da mulher, cuja subsistência autónoma está vedada em muitos países.
4. O estilo de vida. O ambiente stressante dos nossos dias favorece a impaciência, a hostilidade e a intolerância. Quando estes traços são levados para o casal, a convivência torna-se mais difícil. Então, pensa-se no divórcio como opção.
5. A cultura do divórcio. Independentemente do nível económico, há países que possuem uma cultura do divórcio. Nestes lugares, os divórcios têm uma longa tradição e têm sido habituais durante anos em todos os extractos sociais. Como consequência, os passos a seguir estão bem definidos e fazem parte da vida normal.
6. A aprovação social. Cada dia que passa é mais frequente encontrar-se casais que provêm de casamentos anteriores, com filhos que convivem com irmãos de pais diferentes, e com sogros com dois filhos e quatro noras. Esta incidência do divórcio fez com que já não tenha o estigma social que uma vez teve, tornando mais ligeira a via do divórcio.
7. A ausência da componente religiosa. O casamento é um invento divino, integrado na existência humana desde o princípio e com um carácter sagrado. Quando as pessoas retiram o significado religioso da sua vida, também o fazem do matrimónio. Desta maneira, o casamento converte-se num contrato entre dois sujeitos (sem a autoridade divina). O contrato pode rescindir-se quando ambas as partes o acharem conveniente, conceito muito diferente do matrimónio religioso, só dissolúvel em circunstâncias extremas e muito concretas.
Muitos casais com problemas contemplam o divórcio como uma via de escape aos conflitos no casal. Mas o divórcio não é uma saída fácil. Na realidade, um processo de divórcio é uma das experiências mais traumáticas que se pode viver. É necessário, portanto, esgotar todos os meios disponíveis para alcançar um nível aceitável de satisfação e evitar, assim, o divórcio.
Seis divórcios em um
Divorciar-se não é uma coisa simples. Requer que se ocupem de vários assuntos que se resolvem em tempos diferentes. Isto transforma o processo em algo longo, lento e doloroso. Na realidade, os divórcios em que há filhos podem não acabar nunca, dado que é possível divorciar-se do cônjuge, mas não dos filhos.
Paul Bohannan comparou o divórcio a uma prolongada viagem de comboio, com seis paragens em seis estações distintas, em que há que resolver assuntos importantes e difíceis. É como se um divórcio fosse, na verdade, seis divórcios.
Muitos casais com problemas contemplam o divórcio como uma via de escape aos conflitos no casal. Mas o divórcio não é uma saída fácil. Na realidade, um processo de divórcio é uma das experiências mais traumáticas que se pode viver.
É necessário, portanto, esgotar todos os meios disponíveis para alcançar um nível aceitável de satisfação e evitar, assim, o divórcio.
* Divórcio emocional. Antes que o divórcio se torne público e oficial, o casal passa por um período de fortes mudanças emocionais. É uma etapa penosa, na qual um ou ambos decidiram dar o passo legal. O amor, que em tempos tiveram, passa a ódio, ressentimento, hostilidade. Algumas pessoas sentem tanta dor psicológica que se voltam para o álcool ou para outras dependências, numa tentativa de afastar o assunto do pensamento. Há quem entre em depressão, outras pessoas contraem doenças, devido às poucas defesas que a preocupação lhes deixa. Uma emoção bastante generalizada é a solidão, uma vez que, das portas para fora, o casamento parece funcionar, mas, na realidade, cada cônjuge sente-se tremendamente só.
* Divórcio legal. Chega o dia em que se deve apresentar os papéis para o divórcio. Em cada país a legislação a esse respeito é diferente. Mas todos pedem uma longa lista de documentos, declarações e trâmites. A experiência é muito desagradável e acentua a frustração. Por essa altura, o casal já não convive, mas tem de entrar em contacto para obter informações, trocar papéis, ir assinar, etc.. Além dos muitos dissabores, há que enfrentar uma série de gastos burocráticos que podem chegar a uma soma respeitável.
*Divórcio económico. A distribuição dos bens é outro capítulo escabroso. O que fazer com a casa, o carro, a conta-poupança, o dinheiro investido, os móveis, são questões que trazem grandes dificuldades. E, num momento de forte tensão emocional, as soluções ainda se tornam mais complexas. Por vezes, as disputas centram-se em questões triviais, mas carregadas de emotividade («Quem é que fica com o candeeiro que comprámos em Praga? E com o cão?»). E depois de repartir o mal, vem a adaptação a uma etapa económica nova e, com frequência, mais difícil. A mulher, quase sempre pior colocada economicamente, tem de se ajustar a despesas mais limitadas do que aquelas a que estava habituada no tempo de casada. O homem, talvez com os mesmos ganhos, descobre que o dinheiro não chega onde antes chegava, devido a gastos que não existiam na presença da esposa.
*Divórcio paternal. De entre todos os aspectos do divórcio, talvez seja este o mais carregado de emoções e de dificuldades. Quem merece o poder paternal? O que é o melhor para os filhos? A quanto ascenderá a pensão de alimentos? Quem pagará os gastos escolares? De quanto em quanto e por quanto tempo poderá visitar os filhos? Mesmo quando estas dificuldades tiverem sido passadas para o papel, a sua aplicação e seguimento costumam ser tortuosos. Muitos pais (ou mães) deixam de pagar a pensão estipulada. Alguns pais e mães manipulam os seus filhos para que deixem de gostar do outro progenitor. Certas mães (ou pais) não consentem as visitas que foram estipuladas pelo juiz. Como resposta, o pai (ou mãe), frustrado pela situação, “rapta” o filho para que passe tempo consigo. E assim se prolonga o litígio, até que os filhos chegam à maioridade. Por vezes, o jovem que foi criado, por exemplo, com a mãe, mostra desejo de conhecer melhor o pai e decide ir viver com ele. Isso irrita, preocupa e frustra a mãe, fazendo com que o divórcio não termine nunca.
*Divórcio extrafamiliar. O divórcio não acontece apenas no círculo familiar íntimo (pais e filhos), mas acontece também no meio de um ambiente social, numa comunidade de pessoas ligadas à família: amigos, vizinhos, parentes, companheiros de trabalho, companheiros de ócio, e outros. Durante a etapa de casados, o casal relacionou-se com todas estas pessoas. Com o divórcio, apresentam-se os reptos de como manter estas relações: Que explicações dar? Em quem acreditarão? As famílias de origem põem-se do lado correspondente e ocupam-se em fazer campanha contra o cônjuge oposto, culpando-o do divórcio. Quem ouve uma das partes, dá-lhe razão e põe-se contra a adversária. Muitos bons amigos do casal retiram-se completamente para evitar conflitos, uma vez que é difícil ser bom amigo de ambas as partes. Isso deixa os divorciados com a tarefa de começar novas amizades.
*Divórcio psicológico. O divórcio psicológico refere-se à tarefa de conseguir autonomia e independência psicológicas, separado/a da influência do ex-cônjuge. Não há dúvida de que, ao conviver com a mesma pessoa durante um período prolongado de tempo, se adquirem certas dependências mentais e comportamentais que, na sua ausência, requerem uma adaptação. O apoio que uma vez se teve no cônjuge tem de ser recebido de outras pessoas ou grupos. A família, amigos íntimos, o grupo de entreajuda podem ser opções satisfatórias. Um risco implícito desta tarefa de conseguir apoio é encontrar alguém do sexo oposto e acabar num casamento precipitado. Esta saída quase nunca é recomendável.
Julián Melgosa
Doutorado em Psicologia
Causas do divórcio
Os dados recolhidos pelos psicoterapeutas matrimoniais M. A. Whisman, A. E. Dixon, e B. Johnson mostram as seguintes causas de divórcio nos seus pacientes, em ordem de maior ou menor frequência:
1. Problemas de comunicação («Não nos entendemos»).
2. Problemas de autoridade («Não nos pomos de acordo, queremos mandar os dois»).
3. Expectativas não realistas («O casamento deveria ser algo fantástico»).
4. Sexualidade («Não estou satisfeito/a com a nossa vida sexual»).
Outros motivos apresentados são: ausência de sentimentos amorosos, conflitos de valores, problemas de personalidade, infidelidade conjugal, falta de demonstrações de afecto, e questões de dinheiro. Ainda há outras razões menos frequentes (ao compará-las com a totalidade de divórcios), mas de grande relevância: abuso do cônjuge, abuso dos filhos, homossexualidade, álcool e outras drogas.
Razões do tipo sociológico
Também existem razões do tipo sociológico que explicam o divórcio e as suas variantes em diferentes lugares e épocas.
1. O contexto legal. Os países com leis que facilitam o divórcio têm um índice mais elevado do que as nações que põem muitas restrições legais a quem se quer divorciar.
2. O movimento feminista. A mulher tem vindo a compreender que ser esposa não é sinónimo de escravidão, o que está completamente certo. Como consequência, muitas mulheres com um casamento irregular têm dado os passos até conseguirem um divórcio.
3. A melhoria económica. As regiões do mundo mais abastadas têm os índices mais elevados de divórcios. Este requer meios económicos ou possibilidades para sobreviver após a rotura, especialmente no caso da mulher, cuja subsistência autónoma está vedada em muitos países.
4. O estilo de vida. O ambiente stressante dos nossos dias favorece a impaciência, a hostilidade e a intolerância. Quando estes traços são levados para o casal, a convivência torna-se mais difícil. Então, pensa-se no divórcio como opção.
5. A cultura do divórcio. Independentemente do nível económico, há países que possuem uma cultura do divórcio. Nestes lugares, os divórcios têm uma longa tradição e têm sido habituais durante anos em todos os extractos sociais. Como consequência, os passos a seguir estão bem definidos e fazem parte da vida normal.
6. A aprovação social. Cada dia que passa é mais frequente encontrar-se casais que provêm de casamentos anteriores, com filhos que convivem com irmãos de pais diferentes, e com sogros com dois filhos e quatro noras. Esta incidência do divórcio fez com que já não tenha o estigma social que uma vez teve, tornando mais ligeira a via do divórcio.
7. A ausência da componente religiosa. O casamento é um invento divino, integrado na existência humana desde o princípio e com um carácter sagrado. Quando as pessoas retiram o significado religioso da sua vida, também o fazem do matrimónio. Desta maneira, o casamento converte-se num contrato entre dois sujeitos (sem a autoridade divina). O contrato pode rescindir-se quando ambas as partes o acharem conveniente, conceito muito diferente do matrimónio religioso, só dissolúvel em circunstâncias extremas e muito concretas.
Muitos casais com problemas contemplam o divórcio como uma via de escape aos conflitos no casal. Mas o divórcio não é uma saída fácil. Na realidade, um processo de divórcio é uma das experiências mais traumáticas que se pode viver. É necessário, portanto, esgotar todos os meios disponíveis para alcançar um nível aceitável de satisfação e evitar, assim, o divórcio.
Seis divórcios em um
Divorciar-se não é uma coisa simples. Requer que se ocupem de vários assuntos que se resolvem em tempos diferentes. Isto transforma o processo em algo longo, lento e doloroso. Na realidade, os divórcios em que há filhos podem não acabar nunca, dado que é possível divorciar-se do cônjuge, mas não dos filhos.
Paul Bohannan comparou o divórcio a uma prolongada viagem de comboio, com seis paragens em seis estações distintas, em que há que resolver assuntos importantes e difíceis. É como se um divórcio fosse, na verdade, seis divórcios.
Muitos casais com problemas contemplam o divórcio como uma via de escape aos conflitos no casal. Mas o divórcio não é uma saída fácil. Na realidade, um processo de divórcio é uma das experiências mais traumáticas que se pode viver.
É necessário, portanto, esgotar todos os meios disponíveis para alcançar um nível aceitável de satisfação e evitar, assim, o divórcio.
* Divórcio emocional. Antes que o divórcio se torne público e oficial, o casal passa por um período de fortes mudanças emocionais. É uma etapa penosa, na qual um ou ambos decidiram dar o passo legal. O amor, que em tempos tiveram, passa a ódio, ressentimento, hostilidade. Algumas pessoas sentem tanta dor psicológica que se voltam para o álcool ou para outras dependências, numa tentativa de afastar o assunto do pensamento. Há quem entre em depressão, outras pessoas contraem doenças, devido às poucas defesas que a preocupação lhes deixa. Uma emoção bastante generalizada é a solidão, uma vez que, das portas para fora, o casamento parece funcionar, mas, na realidade, cada cônjuge sente-se tremendamente só.
* Divórcio legal. Chega o dia em que se deve apresentar os papéis para o divórcio. Em cada país a legislação a esse respeito é diferente. Mas todos pedem uma longa lista de documentos, declarações e trâmites. A experiência é muito desagradável e acentua a frustração. Por essa altura, o casal já não convive, mas tem de entrar em contacto para obter informações, trocar papéis, ir assinar, etc.. Além dos muitos dissabores, há que enfrentar uma série de gastos burocráticos que podem chegar a uma soma respeitável.
*Divórcio económico. A distribuição dos bens é outro capítulo escabroso. O que fazer com a casa, o carro, a conta-poupança, o dinheiro investido, os móveis, são questões que trazem grandes dificuldades. E, num momento de forte tensão emocional, as soluções ainda se tornam mais complexas. Por vezes, as disputas centram-se em questões triviais, mas carregadas de emotividade («Quem é que fica com o candeeiro que comprámos em Praga? E com o cão?»). E depois de repartir o mal, vem a adaptação a uma etapa económica nova e, com frequência, mais difícil. A mulher, quase sempre pior colocada economicamente, tem de se ajustar a despesas mais limitadas do que aquelas a que estava habituada no tempo de casada. O homem, talvez com os mesmos ganhos, descobre que o dinheiro não chega onde antes chegava, devido a gastos que não existiam na presença da esposa.
*Divórcio paternal. De entre todos os aspectos do divórcio, talvez seja este o mais carregado de emoções e de dificuldades. Quem merece o poder paternal? O que é o melhor para os filhos? A quanto ascenderá a pensão de alimentos? Quem pagará os gastos escolares? De quanto em quanto e por quanto tempo poderá visitar os filhos? Mesmo quando estas dificuldades tiverem sido passadas para o papel, a sua aplicação e seguimento costumam ser tortuosos. Muitos pais (ou mães) deixam de pagar a pensão estipulada. Alguns pais e mães manipulam os seus filhos para que deixem de gostar do outro progenitor. Certas mães (ou pais) não consentem as visitas que foram estipuladas pelo juiz. Como resposta, o pai (ou mãe), frustrado pela situação, “rapta” o filho para que passe tempo consigo. E assim se prolonga o litígio, até que os filhos chegam à maioridade. Por vezes, o jovem que foi criado, por exemplo, com a mãe, mostra desejo de conhecer melhor o pai e decide ir viver com ele. Isso irrita, preocupa e frustra a mãe, fazendo com que o divórcio não termine nunca.
*Divórcio extrafamiliar. O divórcio não acontece apenas no círculo familiar íntimo (pais e filhos), mas acontece também no meio de um ambiente social, numa comunidade de pessoas ligadas à família: amigos, vizinhos, parentes, companheiros de trabalho, companheiros de ócio, e outros. Durante a etapa de casados, o casal relacionou-se com todas estas pessoas. Com o divórcio, apresentam-se os reptos de como manter estas relações: Que explicações dar? Em quem acreditarão? As famílias de origem põem-se do lado correspondente e ocupam-se em fazer campanha contra o cônjuge oposto, culpando-o do divórcio. Quem ouve uma das partes, dá-lhe razão e põe-se contra a adversária. Muitos bons amigos do casal retiram-se completamente para evitar conflitos, uma vez que é difícil ser bom amigo de ambas as partes. Isso deixa os divorciados com a tarefa de começar novas amizades.
*Divórcio psicológico. O divórcio psicológico refere-se à tarefa de conseguir autonomia e independência psicológicas, separado/a da influência do ex-cônjuge. Não há dúvida de que, ao conviver com a mesma pessoa durante um período prolongado de tempo, se adquirem certas dependências mentais e comportamentais que, na sua ausência, requerem uma adaptação. O apoio que uma vez se teve no cônjuge tem de ser recebido de outras pessoas ou grupos. A família, amigos íntimos, o grupo de entreajuda podem ser opções satisfatórias. Um risco implícito desta tarefa de conseguir apoio é encontrar alguém do sexo oposto e acabar num casamento precipitado. Esta saída quase nunca é recomendável.
Julián Melgosa
Doutorado em Psicologia
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